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Na Serra da Jurema, o ponto mais alto de Guarabira, município localizado no Agreste paraibano, uma cena repetida várias vezes causava estranheza para os habitantes da região: um jovem caminhava até o cume com capacete, mochila, apoiando-se em dois bastões de alpinismo e arrastando, por cordas, pesados pneus. Esse era o treino do paraibano Josenildo Correia da Silva, o Nildo, um dos três personagens do documentário Encontrando o Eterno, longa-metragem em pré-produção com direção da carioca Rosane Santiago.

Em 2013, Nildo morreu depois de escalar o Monte Aconcágua, na Argentina, simultaneamente o ponto mais alto das Américas e de todo o Hemisfério Sul. Seria a mais alta do mundo se não houvesse a cordilheira do Himalaia, onde se encontra o Monte Everest.

“Ele não era só um nordestino do Brejo, mas um herói nacional”, aponta a diretora, relembrando que, quando treinara a subida nas depressões do município brejeiro, visando à vastidão branca do Aconcágua, Nildo era apelidado pelos outros de ‘o doido do pneu’.

Mas a história do paraibano não existiria no documentário sem outra tragédia. “Tudo começou com um pedido de uma pessoa para ajudar uma mãe com seu filho desaparecido. Era Bernardo Collares”.

Bernardo era um mineiro radicado no Rio de Janeiro que “ajudou a organizar o montanhismo brasileiro”, sendo um dos criadores da Federação de Esportes de Montanha do Rio (Femerj) e da Confederação Brasileira de Montanhismo e Escalada. Nos primeiros dias de 2011, ele fez sua última escalada no Monte Fitz Roy, na Patagônia argentina.

Estava acompanhado da escaladora Kika Bradford. Precisaram descer por causa do mau tempo, mas aconteceu um acidente e Bernardo fraturou a bacia e, aparentemente, tinha sinais de hemorragia, impossibilitando a sua descida. Após algumas horas, ela desceu a pedido dele para buscar ajuda. Devido às condições climáticas severas, não foi possível realizar o resgate naquele momento e, até hoje, seu corpo continua desaparecido.

A ajuda que a cineasta encontrou para consolar a mãe foi fazer o filme, abordando também profundamente o mundo das alturas. “Até que vi uma matéria sobre um rapaz cujo corpo havia sido resgatado. Era um paraibano”.

De acordo com Roseane Santiago, Nildo trabalhava em uma loja de bebidas em Guarabira e sobrevivia com um salário mínimo. Tudo que ele fazia na vida era com a cabeça no cume das montanhas. Com seus treinos inusitados e improvisados, tornou-se uma pessoa notória na sua pequena cidade e fazia amizades via internet para escalar. Viajou três vezes à Argentina e uma vez à Rússia.

“Nildo era um homem sofisticado que adorava literatura e treinava escalada na Pedra da Boca (em Araruna, também no Agreste paraibano)”, aponta a documentarista. “Ele foi atrás de seus sonhos com muita força de vontade. Não estava nem ai pro mundo. Tinha um sonho: o de ser alpinista. Ele subiu a última parte do Aconcágua sozinho. Uma subida que exigia – no mínimo – uma equipe com três pessoas”.

Em Encontrando o Eterno, a parte do paraibano será toda contada em estilo e versos de cordel, criada por Alexandre Moca. Além de contar a luta de trazer o corpo de Nildo de volta ao Estado, a diretora planeja retornar à Argentina para investigar o que aconteceu com os protagonistas do longa.

‘Escalada’ íngreme

Como as duas histórias eram “pesadas demais”, Rosane inseriu mais um personagem igualmente importante ao tema: a paraense Cleo Weidlich, segunda brasileira a conquistar o Monte Everest. Essa façanha foi feita aos 46 anos de idade. Atualmente, a alpinista está com 50 anos.

A princípio, a própria diretora desconhecia suas origens tupiniquins, já que Cleo, morando nos Estados Unidos, utiliza o passaporte norte-americano para facilitar as suas expedições.

Ela sofreu um acidente em Kanchenjunga, terceira montanha mais alta do mundo, situada na Cordilheira do Himalaia. Seu tratamento para o trauma? “A fisioterapia dela foi no Aconcágua, subindo a montanha”, revela a cineasta carioca. “Cleo aprendeu a subir escalando as gigantescas árvores da Amazônia”.

Com o roteiro finalizado, Rosane Santiago tem outro desafio na ‘escalada’ do documentário, que é a falta de apoio para o projeto. Com uma logística de produção complexa que engloba várias partes do Brasil e do mundo, como a Argentina e Índia, dentre outras localidades, ela luta contra o tempo para voltar onde os sonhos de Nildo e Bernardo Collares se findaram. Segundo a realizadora, sua equipe deve ir ao Aconcágua até este mês. Caso o contrário, o monte platino só será reaberto no próximo ano.

Caso tudo dê certo, a diretora pretende voltar à Paraíba (ela já veio três vezes para encontrar com a família de Nildo) e acabar as filmagens no mês de agosto para dar início à pós-produção. Sua intenção é colocar Encontrando o Eterno no circuito de cinemas do país.

“São histórias que, depois de 120 minutos, as pessoas vão sair do cinema e…”, ela complementa dando um grande e prazeroso suspiro. “O filme mostra como o brasileiro é, com essa força que transpõe montanhas. E nunca a Paraíba foi tão bem representada com o Nildo”.

Com Jornal da Paraíba
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