Ao investigar a morte de uma menina de quatro anos vítima de
maus-tratos, a Polícia Civil de Santana do Livramento (a 489 km de Porto
Alegre), na fronteira oeste gaúcha, deparou-se com uma história de
crueldade. Vivendo em meio à miséria, dez crianças entre 4 e 10 anos
dividiam o teto com dois adultos.
De acordo com depoimento da madrasta à polícia, a menina de quatro
anos era molestada pelo pai nas madrugadas e sofria tortura sistemática
da madrasta. O caso chocou os moradores da cidade de 83,3 mil
habitantes, no extremo oeste do Rio Grande do Sul.
Na manhã dessa quarta-feira (24), paramédicos foram acionados para
atender a uma ocorrência no bairro Parque do Sol. A madrasta havia
requisitado uma ambulância para socorrer a enteada que estaria “passando
mal”. Ao chegarem ao hospital e examinarem o corpo já sem vida da
menina, médicos constataram severas lesões, inclusive ferimentos
condizentes com abuso sexual.
Polícia Civil e Brigada Militar prenderam em flagrante o homem, de 32
anos, e a mulher, de 31. Em depoimento, a madrasta admitiu torturar a
menina e saber dos abusos que o marido – pai da criança – praticava.
“Ela foi omissa, sabia e podia ter impedido o abuso. Durante a
madrugada [de quarta-feira], ela desconfiou de que a menina estivesse
sendo estuprada. E ficou inerte. Motivo pelo qual ela também responderá
por estupro de vulnerável”, explica a delegada da 1ª Delegacia do
município, Giovana Ferreira Muller.
Segundo a polícia, marido e mulher serão indiciados por estupro de
vulnerável e tortura. Já a madrasta também responderá por homicídio
qualificado por motivo fútil. “Os médicos revelaram que a menina morreu
por uma forte batida na cabeça. A mulher admitiu que jogou a criança com
força contra uma parede”, afirma Giovana.
Rotina de tortura
Para a delegada, está claramente configurado também o crime de
tortura. Na certidão de óbito da menina, por exemplo, enterrada na tarde
desta quinta (25), está escrito “hematoma subdural, traumatismo crânio
encefálico e politraumatismos generalizados”.
“Conforme o depoimento da madrasta, a menina era colocada de castigo
diversas vezes.Um desses castigos era ficar ajoelhada no chão, virada
para uma parede, durante toda manhã ou toda a tarde. Amenina ficava tão
esgotada que na conseguia se levantar depois”, descreve Giovana.
Outros “castigos” empregados pelo pai e madrasta compreendiam surras
com vara e até socos,que chegaram a quebrar um dente da criança. “É um
crime que choca muito, é uma barbárie, principalmente por se tratar de
uma criança vulnerável nas mãos de quem deveria protegê-la”, desabafa a
delegada.
Além do casal e da menina, dividiam espaço na casa outras nove
crianças, algumas portadoras de necessidades especiais. Os adultos foram
presos em flagrante e encaminhados ao Presídio de Santana do
Livramento. Já as crianças estão sendo atendidas pelo CT (Conselho
Tutelar).
Conforme o Conselho Tutelar, a família era acompanhada, os abusos
sexuais não eram conhecidos, e, inclusive, os conselheiros já haviam
feito um pedido à Justiça para a transferência de tutela das crianças e
ainda está em tramitação (UOL).