O jornal britânico The Observer defendeu em editorial, neste domingo,
que a presidente brasileira Dilma Rousseff renuncie ou que sejam
convocadas novas eleições “se ela não consegue restabelecer a calma” no
país.
O Observer é a versão dominical do jornal The Guardian, de linha editorial de centro-esquerda.
“Uma preocupação óbvia é que esses protestos (contra e pró-governo),
se saírem do controle, poderiam degenerar em violência desenfreada e no
risco de intervenção pelas Forças Armadas”, diz o jornal, um dos
principais da Grã-Bretanha, no editorial intitulado “A visão do Observer
para o Brasil”.
“A democracia brasileira, restaurada em 1985 depois de 20 anos de
ditadura militar, não chega a ser uma planta tão robusta que não possa
ser desenraizada novamente por uma combinação de fracasso político e
emergência econômica. O dever de Dilma é simples: se ela não pode
restabelecer a calma, tem de convocar novas eleições – ou sair.”
O cientista político da consultoria Tendências, Rafael Cortez, porém,
explica que, em um sistema presidencialista como o brasileiro, Dilma
não tem o poder de convocar novas eleições.
“O mecanismo institucional para a convocação de novas eleições aqui
seria ou uma renúncia coletiva da presidente e do vice (Michel Temer) ou
a cassação da chapa (Dilma-Temer) por uma ação no Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) em função de irregularidades na campanha. Talvez tenha
havido alguma confusão com o sistema parlamentarista”, afirma.
Lembrando que a Olimpíada de 2016 será realizada no Rio de Janeiro, o
Observer ressalta que os países que recebem o evento normalmente tentam
apresentar sua face mais atrativa para a audiência global. “Esse não é o
caso do Brasil”, diz.
“Por coincidência ou não, uma série de problemas sérios do país estão
se agravando aos olhos do público”, completa, mencionando a recessão
econômica, a crise política, o surto de zika, e o “alto índice de
criminalidade em cidades como o Rio”.
Segundo o jornal, esses problemas podem “tirar um pouco do brilho” da Olimpíada no Brasil.
Economia
Para o Observer, os problemas econômicos brasileiros em parte foram
causados pela queda das commodities no mercado global, mas “uma expansão
fiscal imprudente” e as “políticas intervencionistas” de Dilma também
contribuíram para reduzir os níveis de confiança no país. “Parte do
sofrimento brasileiro foi autoinfligido”, defende.
No editorial, o jornal também opina que é uma “simplificação” ver a
crise brasileira e os problemas do governo do PT como parte de um
refluxo de uma “onda rosa” socialista na América Latina.
“Em uma semana em que o (presidente dos EUA) Barack Obama faz uma
visita histórica à Cuba, abrindo caminho para o capitalismo de livre
mercado como alternativa à tradição comunista e coletivista da ilha, os
problemas brasileiros podem ser vistos como nova evidência do refluxo da
‘onda rosa’ socialista na América Latina. Com a morte de Hugo Chávez, a
revolução bolivariana na Venezuela está de joelhos. A Argentina, que
Obama visitará depois, deu uma guinada à direita”, diz o jornal.
“(Mas) essa é uma leitura equivocada e simplista. Como o Brasil
mostra, os líderes da esquerda fizeram muitos erros. Mas não é sua
ideologia que está sendo rejeitada – e sim sua incompetência e
ilegalidade”, opina.
O artigo despertou uma série de críticas no website do jornal.
Para alguns leitores, o Observer errou ao ignorar como a questão
“ideológica” teria contribuído para a crise. “Os erros que arruinaram a
economia brasileira vieram diretamente da ideologia deles (PT) –
intervencionismo, falta de reforma das leis trabalhistas, excesso de
gastos (…)”, diz o leitor identificado como “Originalpseudonym”.
Outros reclamam que o jornal ignorou as manifestações de apoio ao PT e
as críticas à operação Lava Jato. “A ‘farsa’ da Lava Jato, além de ter
um impacto econômico, pegou ‘atalhos em procedimentos legais'”, diz o
leitor “CariocaEoin”.
BBC Brasil