O pai de Aylan Kurdi, o menino sírio de três anos que foi encontrado
morto em uma praia da Turquia e cuja foto se tornou um símbolo da crise
migratória na Europa, falou nesta quinta-feira (3) sobre a tragédia.
Abdullah Kurdi perdeu também a mulher e outro filho de cinco anos no
naufrágio. “Meus filhos escorregaram das minhas mãos”, disse à agência
de notícias turca Dogan.
“Tínhamos jalecos salva-vidas, mas o
barco afundou porque várias pessoas se levantaram. Carreguei a minha
mulher nos braços. Mas meus filhos escorregaram das minhas mãos”, contou
ele.
Ele disse que a família pagou para atravessar da Turquia
para a ilha grega de Kos duas vezes. “Numa delas, os guardas nos
pararam. Aí fomos libertados. Da segunda vez, os organizadores não
cumpriram com a promessa e não trouxeram o barco. Então conseguimos um
barco por nossos próprios meios”, relatou à agência turca.
“Mas,
depois de navegarmos 500 metros, começou a entrar água no barco. Nossos
pés ficaram molhados. Criou-se um pânico, e quando as pessoas tentaram
ficar de pé, a situação piorou”, contou.
Abdullah e a família
tentavam reencontrar parentes no Canadá embora o pedido de asilo tivesse
sido negado, de acordo com o site “National Post”.
Família combateu Estado Islâmico
Após
o naufrágio, na quarta-feira (2), Abdullah ligou para a irmã, que mora
em Vancouver há 20 anos, e disse que seu único desejo é voltar para a
cidade de Kobane para enterrar seus familiares e ser enterrado ao lado
deles. De acordo com ele, 16 membros de sua família que combatiam o
grupo jihadista Estado Islâmico (EI) morreram na sua cidade natal.
Depois
que o naufrágio se tornou público, o Canadá ofereceu asilo a Abdullah,
mas ele afirmou que rejeitou a oferta, segundo a agência EFE.
“Recebi
uma oferta do governo do Canadá para morar lá, mas depois do que
aconteceu não quero ir. Vou levá-los primeiro a Suruç (cidade turca na
fronteira com a Síria) e depois a Kobane, na Síria. Passarei o resto da
minha vida lá”, explicou.
O sírio pediu também à comunidade internacional que faça o possível para evitar sofrimentos como o seu.
“Quero
que o mundo inteiro nos escute e veja onde chegamos tentando escapar da
guerra. Vivo um grande sofrimento. Faço esta declaração para evitar que
outras pessoas vivam o mesmo”, disse Kurdi nesta quinta-feira (3) a
jornalistas turcos diante do Instituto Médico Legal da cidade de Mugla.
Teema
Kurdi, irmã de Abdullah, disse ao “National Post” que o pedido de
refúgio havia sido negado em junho pelo Ministério da Cidadania e da
Imigração devido a complicações envolvendo os pedidos de refúgio para
estrangeiros.
Fotógrafa diz que ficou ‘petrificada’ com a cena
A fotógrafa responsável pela imagem do corpo de Aylan na praia também falou sobre o caso nesta quinta-feira (3).
Ela
disse ter ficado “petrificada” com a cena e contou que também viu
Galip, irmão dele, no chão, a 100 metros dali. “A única coisa que eu
poderia fazer era tornar seu clamor ouvido. Naquele momento, eu pensei
que poderia fazer isso ao acionar minha câmera e fazer sua foto”, contou
a fotógrafa.
Demir cobre as imigrações na região há 15 anos. “Eu
testemunhei muitos incidentes com imigrantes nesta região, suas mortes,
seus dramas. Espero que isso agora mude. Fiquei chocada, me senti mal
por eles. A melhor coisa a fazer era tornar sua tragédia conhecida. ”
Naufrágio
Pelo
menos nove sírios morreram no naufrágio que matou a família de
Abdullah, segundo a agência AFP — outros veículos já citam 12. As duas
embarcações haviam partido do balneário turco de Bodrum e tentavam
chegar à ilha grega de Kos.
A foto virou um dos assuntos mais
comentados no Twitter e diversos veículos da imprensa internacional o
destacaram como emblemática da gravidade da situação, até mesmo com
potencial para ser um divisor de águas na política europeia para os
imigrantes.
O primeiro-ministro da França, Manuel Valls, disse que
a morte do menino sírio mostram a necessidade de ação urgente da Europa
na crise migratória. “Ele tinha um nome: Alyan Kurdi. Ação urgente é
necessária – uma mobilização da Europa inteira é urgente”, escreveu
Valls em sua conta no Twitter nesta quinta-feira.
Na quarta-feira,
Itália, França e Alemanha assinaram um documento conjunto pedindo pela
revisão das atuais regras da União Europeia sobre garantia de asilo e
uma distribuição “justa” de imigrantes no bloco, informou o Ministério
das Relações Exteriores da Itália.