Zezé
Parteira, a mãe Zezé para a comunidade pobre de Taquara, em Caruaru,
onde mora, a 150 km do Recife, é mais um personagem da série fenômenos
eleitorais municipais na região Nordeste nas eleições municipais deste
ano, realizada pelo blog do Magno Martins, de Pernambuco, em parceria
com o Portal MaisPB,
Zezé teve 945 votos e foi eleita vereadora do município pelo PV com um detalhe: não pediu um só voto a ninguém.
CARUARU- Uma
das mais belas surpresas que as urnas do pleito municipal deste ano
provocaram está encravada em Caruaru, famosa capital do forró: a eleição
de uma candidata sem pedir um único voto, enfurnada em casa, que não
fez campanha e gastou apenas R$ 21 com a confecção da sua foto para ser
colocada na urna eletrônica e nos santinhos. Maria José Galdino, 59
anos, a “Mãe Zezé”, como é tratada carinhosamente no sítio Taquara de
Cima, onde mora, é autora desta incrível façanha por causa do seu
notável trabalho humano e solidário como parteira.
Desde os 18
anos fazendo parto em sua casa, que se transformou numa verdadeira
maternidade, Zezé nunca cobrou um centavo de ninguém para trazer vidas
humanas ao mundo. Segundo cálculos dela própria, duas mil crianças já
nasceram com a ajuda das suas santas mãos desde que aprendeu a arte com a
sua mãe. “Aqui, a parteira sou eu, e o médico é Jesus Cristo”,
desabafa. Os 945 votos que garantiram sua vitória são de eleitores que
estão ligados diretamente a uma grande família constituída na medida em
que a ela foi confiada à missão do parto nos últimos 40 anos.
“Eu
não sei pedir voto, eu sei pedir comida e ajuda para o povo necessitado
de Taquara”, afirma a mãezona de uma comunidade pobre, sem assistência
de saúde, que depende dela até para um socorro de emergência. Com uma
ambulância doada pelo programa de Faustão, há mais de dez anos, Mãe Zezé
transporta doentes em estado mais grave para o hospital regional de
Caruaru. Por muito tempo, as despesas de combustível e motorista
foram pagas pela Prefeitura, mas com a eleição do atual prefeito, em
2008, o auxílio acabou cortado.
“Tony Gel, quando prefeito, nos
deu um motorista e uma cota de combustível até o último dia em que ficou
no poder, mas José Queiroz, ao assumir cortou de imediato”, afirmou.
Restou a Zezé apelar para amigos e até tirar dos seus próprios recursos.
Como agente de saúde do município, ela tem uma renda de dois salários
mínimos e seu marido, doente, deixou de trabalhar há mais de dez anos.
Zezé
foi eleita pelo PV, partido da coligação de Tony Gel (PMDB), derrotado
na disputa de segundo turno para prefeito de Caruaru. Com a sua vitória,
passa a ser a única voz em defesa das mulheres na Câmara de Vereadores a
partir de janeiro de 2017. Assalariada, gente do povo e da zona rural, é
tão querida em sua comunidade que é tratada por mãe ou tia por quase
todas as crianças e jovens.
Todos os anos, Mãe Zezé acompanha pelo
menos 40 grávidas, do pré-natal ao parto. No Brasil, estima-se que 98%
dos partos ocorram em hospitais. Os outros 2%, cerca de 50 mil vidas,
têm participação direta das mulheres parteiras, como ela, que, na maior
parte das vezes, não sabem ler nem escrever e exercem um papel de
autoridade perante seus vizinhos. Zezé diz que já se meteu até em briga
de casais. “Tem momentos que fazemos papel de juiz, delegado, advogado.
Tudo para manter a ordem na comunidade”, afirma.
Embora tenha
tirado do seu próprio bolso apenas R$ 21 para pagar a foto de campanha,
Mãe Zezé recebeu uma doação de R$ 225, segundo o site Divulga
Candcontas, do Tribunal Superior Eleitoral.
“Eu não pedi um tostão a
ninguém, isso é obra do meu partido”, afirma, referindo-se ao advogado
David Cardoso, presidente do PV, que montou a chapinha que garantiu a
eleição da parteira. “O que ajudou na vitória dela foi o fato de o PV
ter ficado fora do chapão”, afirma Cardoso, que confirma ter feito
doações para Zezé através do partido.
Eleita, Mãe Zezé já tem
alguns projetos em mente. Seu mandato será voltado exclusivamente para
trazer benefícios para Taquara, uma comunidade de 2,5 mil famílias
carentes. “Quero de imediato uma creche para que as mães pobres e sem
marido possam deixar seus filhos enquanto estiverem no trabalho”,
destaca, acrescentando que trabalhará, igualmente, para implantação de
um centro de atendimento ao idoso.
Ela não tem noção exata do
valor do subsídio e diz que também não está preocupada com isso,
referindo-se ao salário que passará em embolsar por quatro anos. “Nem
sei o valor nem procurei saber”, afirma, dando em seguida uma sonora
gargalhada, componente do seu perfil de pessoa feliz e animada com a
vida. “O que eu receber, meu filho, vai ser para tirar o meu sustento e
ajudar também o povo daqui. O que sobrar das minhas despesas será para
quem estiver mais necessitado”, afirmou, com o coração de mãezona.
Quem
recorre às mãos santas de Mãe Zezé para o parto natural decide pela
fama e o conceito que ela ganhou em Caruaru e região. “Aqui, vem gente
até da Paraíba”, diz ela. Na última sexta-feira, Maria de Fátima,
residente no centro de Caruaru, trocou o hospital pela “maternidade” de
Zezé para ganhar menino, como se diz no Agreste. Foram pouco mais de 20
minutos do centro da cidade até a Casa de Parto, onde dona Zezé atende
as gestantes da comunidade.
Deu tempo de acompanhar toda a
preparação para o nascimento do Jean Lucas. Das caminhadas que a mãe fez
pela manhã, para estimular as contrações, às dores, gritos e gemidos,
que se intensificam até o momento de dar à luz.
“Tem mulher que precisa
de mais preparo e exercícios. Antes do parto, eu tenho uma conversa e
mostro as técnicas e os recursos naturais que usamos”, diz Zezé.