Quase dois anos depois de aprovar a pioneira lei que regula o mercado
da maconha sob o controle do Estado, o governo do Uruguai anunciou
nesta quinta-feira (1º) que duas empresas se encarregarão de cultivar
cannabis e fixou um prazo “não menor a oito meses” para que seja vendido
em farmácias.
O acesso da população em geral a esta substância,
por meio de registro e através de estabelecimentos farmacêuticos, tinha
se transformado até agora em um constante adiamento desde que, em agosto
de 2014, o Estado convocou empresas interessadas em produzi-la.
O
motivo, segundo explicou o governo em várias ocasiões, era outorgar
maiores prazos às empresas para assegurar que não “ocorram falhas”, por
considerar que o país está no ponto de mira internacional na matéria.
Hoje,
e após um processo de qualificação técnica e seleção realizado pelo
Instituto de Regulação e Controle de Cannabis (Ircca), foi anunciado que
duas empresas obtiveram do governo as licenças de produção e
distribuição da maconha de uso psicoativo que, controlada pelo Estado,
será vendida em farmácias.
“Para que o produto chegue às farmácias
vai transcorrer um prazo seguramente não menor a oito meses a partir
deste momento e, neste marco, o Estado iniciará campanhas de divulgação
sobre os riscos do consumo para a saúde”, explicou o presidente da Junta
Nacional de Drogas do Uruguai, Juan Andrés Roballo.
De capital
uruguaio e estrangeiro, essas duas empresas, das 22 que se postularam,
serão as encarregadas de produzir, a princípio, até duas toneladas
anuais de produto em um lugar de propriedade estatal situado ao sudoeste
do país e que contará com segurança tanto de gestão pública como
privada das próprias empresas.
40 gramas mensais
O
objetivo determinado por lei é que o cannabis, cujas sementes ainda
estão em fase de avaliação a fim de obter uma genética própria, chegue
aos cidadãos que oportunamente se registrem no Ircca em doses de até 40
gramas mensais e 10 semanais.
O governo continua em negociações
com as farmácias, estabelecimentos que a lei estabelece como
dispensadores da maconha, e já há uma minuta de acordo e uma ata de
entendimento sobre 11 pontos básicos que têm a ver com as condições de
armazenamento e segurança.
Consultadas pela Agência Efe, fontes do
Centro de Farmácias do Uruguai, grêmio dos proprietários destes
estabelecimentos, evitaram fazer declarações – como é habitual desde a
aprovação da lei -, mas assinalaram que se trata de um tema “muito
delicado” no país e que por enquanto “não há certeza” dos detalhes sobre
como acontecerá a venda.
US$ 1
A grama de
maconha custará cerca de US$ 1, um preço pensado “com certa margem” para
poder ser adequado ao que é o preço do mercado ilegal, explicou em
entrevista coletiva o presidente da junta diretiva do Ircca, Augusto
Vitale.
“Parece correto que se siga apostando que a grama de
cannabis custe US$ 1 e continue sendo competitivo com o mercado negro,
porque é um dos objetivos principais da política”, declarou à Efe Hernán
Delgado, integrante da ONG Proderechos, uma das impulsoras da
legalização do cultivo.
Por enquanto, até que se possa pagar por
ela legalmente, já há duas formas ter acesso legal a cannabis no país
sul-americano, não sem antes executar um longo trâmite burocrático de
registro.
Desde meados de 2014 está em andamento o cultivo
doméstico, destinado aos que se registrem para plantar certa quantidade
de maconha em sua própria casa, assim como os chamados clubes canábicos,
que funcionam como uma espécie de cooperativa para o cultivo coletivo
de um grupo limitado de pessoas.
Para Victoria Verrastro, da
Proderechos, o anúncio desta quinta “é um começo” e demonstra que o
Executivo tem vontade política de implementar a lei. Neste sentido,
disse que o sistema de farmácias “é muito importante” porque será o
responsável por abastecer a maioria dos usuários.
No entanto,
estas duas licenças “ainda não fazem a cobertura total para todos os
usuários estimados de cannabis”, criticou Verrastro, que afirma que
55.000 pessoas consomem maconha várias vezes por semana e 18.000
diariamente no Uruguai.
No entanto, até agora são mais de 3.000
usuários legalizados em todo o país entre cultivadores domésticos e os
organizados em clubes canábicos.
Acabar com o negócio do
narcotráfico foi uma das principais razões para que, sob o mandato de
José Mujica (2010-2015), tenha sido aprovada em dezembro de 2013 uma lei
que transformou o Uruguai em pioneiro neste enfoque da luta antidrogas.
Após
a licitação anunciada nesta quinta para vender maconha recreativa, com
investimentos das empresas não menores a US$ 600 mil e que podem chegar a
US$ 2 milhões, fica pela frente a correspondente às que produzirão a
substância para uso medicinal ou de pesquisa.
G1