O
jurista e professor Luiz Flávio Gome, presidente do instituto “Avante
Brasil” publicou um artigo (reproduzido com destaque no Portal Congresso
em Foco) em que faz um alerta assustar aos condutores de veículos,
cercados, como ele bem diz, por uma “Lei Seca exagerada”.
De acordo com o novo regramento (que agora se impõe como de
“tolerância zero”), explica o jurista, um mero enxaguante bucal pode ser
motivo de levar o condutor distraído à cadeia por 3 anos, além de ter
seu registro de motorista cassado.
No decorrer de suas explicações, o professor traz fatos pitorescos do
que vem acontecendo pelas “blitz” do país, em que o bafômetro vem sendo
a arma mais temida por aqueles que sequer ingerem álcool.
Confira o artigo e fique ‘antenado’!
Nova Lei Seca: enxaguante bucal, três anos de cadeia
Por força da Resolução 432/13 do Conselho Nacional de Trânsito
(Contran), que regulamentou a Lei 12.760/12 (nova Lei Seca), um bombom
com licor poderia significar para o motorista R$ 1.915,40 de multa, um
ano sem carteira, apreensão do veículo, sete pontos no prontuário etc.
Um enxaguante bucal pode significar até três anos de prisão. Como assim?
O Brasil, com a política da “tolerância zero” de álcool no sangue, se
tornou uma dos 12 países do mundo mais rigorosos em matéria de
embriaguez ao volante. Dentre os 82 países pesquisados pela
International Center for Alcohol Policies (EUA) (Folha de S. Paulo de
25.06.08, p. C3), 11 deles adotavam o tolerância zero de forma absoluta:
Armênia, Azerbaijão, Colômbia, Croácia, República Tcheca, Etiópia,
Hungria, Nepal, Panamá, Romênia e Eslováquia. A esse rol agora temos que
acrescentar o Brasil, 12º país a se incorporar ao restrito grupo da
tolerância zero.
Ficar sem habilitação durante um ano em virtude de um bombom com
licor, no entanto, nos parece uma regra excessiva. Há duas formas de a
lei penal não produzir eficácia preventiva: quando ela não é aplicada,
garantindo dessa forma a impunidade do infrator (caso Edmundo, por
exemplo), ou quando ela é exageradamente desproporcional, desequilibrada
e desarrazoada.
A criminologia midiática, por força do populismo penal, normalmente
apoia tudo quanto é tipo de endurecimento das normas, porque ela
acredita, tanto quanto nossos ancestrais das cavernas, que pintando o
animal na parede já se tem a posse dele (que basta a edição de nova lei e
tudo vai ser resolvido). Ela acha que quanto mais dureza, menos crimes.
Crença infundada. De 1990 a 2012, o legislador brasileiro aprovou 86
leis penais e nenhum crime diminuiu (muito menos as mortes no trânsito).
A reportagem da Folha de S. Paulo (31.01.13, p. C9), com autorização
da Polícia Militar, fez o
seguinte teste: uma pessoa comeu um bombom com
licor, outra usou um enxaguante bucal e a terceira bebeu 200 ml de
cerveja (menos de meio copo de cerveja). Em seguida passaram pelo
etilômetro (bafômetro). Resultado: 0,08 mg, 0,34 mg e 1,31 mg,
respectivamente. A primeira situação teria sido enquadrada na infração
administrativa e as duas últimas no crime do artigo 306. Dura lex sed
lex, disse o militar (com outras palavras) que acompanhava o teste.
Os critérios puramente quantitativos, como se vê, criam situações de
muita injustiça e de desequilíbrio. A resolução citada, de qualquer
modo, tem fundamento no disposto no artigo 276 do Código de Trânsito
Brasileiro (CTB): “Qualquer concentração de álcool por litro de sangue
ou por litro de ar alveolar sujeita o condutor às penalidades previstas
no art. 165“(redação dada pela Lei 12.760, de 2012)”.
A tolerância zero passou a ser absoluta em relação ao exame de sangue
e relativa no que diz respeito ao etilômetro, visto que ele exige o
mínimo de 0,05 mg/L de ar alveolar expirado. Nada, praticamente nada,
escapa do novo regramento jurídico.
O parágrafo único do artigo 276 diz:
“O Contran disciplinará as margens de tolerância quando a infração
for apurada por meio de aparelho de medição, observada a legislação
metrológica”. (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012). Isso foi feito
na Resolução 133/2012.
A tolerância, antes, equivalia a 0,1 miligrama de álcool por litro de
ar alveolar, correspondente a dois decigramas de álcool por litro de
sangue. Havia uma alcoolização absolutamente insignificante inclusive
para fins administrativos (sancionatórios). Com a nova resolução tudo se
alterou. A tolerância é praticamente zero (0,05 mg/L).
Mas é justo cassar a habilitação, por um ano, de quem, com baixíssima
ingestão de álcool ou outra substância psicoativa (bombom com licor ou
enxaguante bucal), dirige normalmente, com segurança, com domínio da
direção, sem afetar, com uma condução anormal, o nível de segurança
viária, muito menos o princípio da condução segura?
Não seria o caso de se aplicar o princípio da insignificância,
livrando o sujeito de qualquer tipo de sanção? Ou, pelo menos, não seria
o caso de se fazer um segundo teste do etilômetro, alguns minutos
depois? No caso da reportagem da Folha de S. Paulo, 15 minutos depois
nada mais foi constatado! Daí o novo posicionamento do capitão da PM
Sérgio Marques: “O motorista tem o direito de aguardar 15 minutos antes
de fazer o teste” (a contraprova). Para ele, o bombom com licor não vai
dar multa (O Estado de S. Paulo de 04.02.13, p. C1).
Uma legislação tão rigorosa como a que temos agora acaba
desestimulando até mesmo a colaboração
do motorista, que certamente vai
raciocinar da seguinte maneira: é melhor não fazer nenhum tipo de teste e
deixar que tudo seja julgado pelos “sinais indicadores da embriaguez”,
que implicam uma valoração subjetiva fluida e lotérica. Soprando o
etilômetro, com certeza vai haver punição e até mesmo injustiça. Não
soprando, pode ser que sim, pode ser que não. Logo…
com Congresso em Foco