Erros de gerenciamento da casa de shows foram a causa da tragédia de
ontem, em Santa Maria, no interior gaúcho, segundo especialistas ouvidos
pela Folha. De acordo com eles, a lição que fica é que é preciso cultivar uma cultura de prevenção a grandes incêndios no país.
O incêndio deixou ao menos 231 mortos (a maioria por asfixia) e 106
hospitalizados. A boate Kiss era uma das principais casas noturnas da
cidade e era famosa por receber estudantes universitários. Segundo o
coordenador da Defesa Civil, Adelar Vargas, o fogo começou na espuma de
isolamento acústico quando um dos integrantes da banda que se
apresentava acendeu um sinalizador, que atingiu o teto.
O guitarrista da banda Gurizada Fandangueira, Rodrigo Lemos Martins, também disse à Folha
que o fogo começou depois que o sinaleiro (chamado por ele de
"sputinik") ter sido aceso. Um segurança da casa e o vocalista da banda
tentaram apagar o incêndio, afirma o guitarrista, porém o extintor não
funcionou.
Para Valdir Pignatta e Silva, professor da Poli/USP e especialista em
segurança contra incêndios, houve ali uma sucessão "absurda" de erros.
Ele cita a falta de sinalização para a saída de emergência e o fato de
haver apenas uma porta de acesso ao local. Também afirma que o teto da
boate era feito de material inflamável.
O pesquisador da Coppe/UFRJ (Coordenação de Programas em Pós-Graduação
em Engenharia) Moacir Duarte diz que as pessoas foram vítimas de uma
"desorganização primária".
"Um vistoria simples, de menos de duas horas, feita por um bombeiro,
bastaria para vetar o local para a realização de shows", disse. "Há uma
cadeia enorme de responsabilidades."
Além das falhas na estrutura, Duarte cita ainda o problema da falta de rádios para a equipe de segurança.
Sem saber o que acontecia, seguranças na porta da boate pensaram
inicialmente que o tumulto havia sido causado por uma briga e barraram
as pessoas para que elas não deixassem o local sem pagar a conta.
Enquanto isso, outros funcionários tentavam combater as chamas em outro
local.
CULTURA
Pignatta e Silva, da Poli, afirma que as pessoas precisam criar um
cultura de salvaguardar sua vida em situações como a encontrada ontem no
Rio Grande do Sul.
"Infelizmente, o fato de existir uma casa com capacidade para mais de
mil pessoas, em um ambiente totalmente fechado, não deu um alerta na
cabeça de ninguém. Ainda mais com objetos pirotécnicos no palco",
afirma.
Segundo ele, em outros países do mundo, como na Inglaterra, as pessoas
têm na memória incêndios que ocorreram no século 17. "Provavelmente, nem
você nem eu teríamos nos preocupado com um incêndio, se tivéssemos
naquela boate", diz.
Do Uol